domingo, 29 de janeiro de 2017

Resumo da Entrevista com a ativista Maria Sol M.

Uma noite, na pensão onde eu morava, a nova moradora fez uso de drogas, ficou agressiva e não deixou ninguém dormir. Eu discuti com ela, e no dia seguinte, a dona da pensão foi notificada do ocorrido.
A usuária de drogas havia pago por 3 meses de estadia e eu havia acertado somente 1. A usuária falou que eu teria que me afastar, ou então iria querer o retroativo que ela havia pago.
A dona da pensão, então, me mandou embora. Foi assim que fiquei morando na rua por cerca de 5 dias.
Quando fiquei na rua não dormi por nenhum momento. Me mantive longe de drogas e álcool, mas o concreto não era convidativo ao sono. As dores de cabeça explodindo pelo cansaço, a fome; A deriva que antecipa o desvio.
Mas essa é somente a minha história. A história que se assemelha a tantas outras, como a da ativista formada em Ferrazópolis, a Maria Sol,  que faz parte do grupo dos moradores de rua da Avenida
Paulista e regiões não institucionalizados e não tutelados. Ela tem 55 anos de idade e é moradora da Paulista desde set/2015.
Como ativista, ela observou as necessidades básicas do dia à dia dos moradores de rua. Ela milita contra a discriminação sobre o morador de rua. Lembra-nos que no Brasil discriminação é crime e acredita que estas 3 ferramentas de atendimento emergencial, inserem o morador de rua na sociedade, combatendo a discriminação. Vou endossar portanto, as propostas de Maria Sol, conforme seguem:

1o- Contratação de leitos livres e ociosos da rede alternativa de hospedagem: hostels -  muitos que estão falindo devido à queda no turismo em São Paulo, pousadas, templos, mosteiros, balneários
municipais. Ela conhece 2 lugares que permitem tal procedimento e já ficou hospedada em um deles: o Estádio do Pacaembú e o clube na Rua Germane Burchard/Perdizes. Devo endossar ao dizer que na Argentina em cidades como Córdoba, os padres dão abrigo a moradores de rua em seus mosteiros e que há projetos no interior de São Paulo que também praticam essa caridade como a Toca de Assis. No entanto, não estou convencida de que essa alternativa seja muito diferente dos albergues e hospícios nos quais os alojam. Solange, no entanto, lembra que a contratação da rede alternativa seria à título de hospedagem, não tutelagem, nem a alimentação desses moradores seria feita lá. Além disso, esses leitos não são como albergues nos quais os quartos são divididos por mais de vinte pessoas: há menos pessoas e também há banheiro no quarto.
Mas ela retrata casos específicos, como as mães de família, estudantes, transtornados mentais, que não podem dividir quartos devido a quadro psico-social. Para estes, ela propõe que a verba direcionada às ONGs/entidades que administram os albergues da prefeitura, seja Repassada diretamente aos moradores de rua que estão referenciados, para que com a arrecadação que é destinada à albergues, os moradores de rua possam pagar seu próprio quarto, deixando assim de serem institucionalizados. De acordo com o grupo "Direito Liberal", em 2016 foram repassados 15 milhões de reais mensais para que essas ONGs cuidassem de 16.000 alberguistas. Maria Sol acredita que houve desvio de verba. Ela diz que "Os órgãos que controlam a assistência social estão aparelhados com grupos políticos, provocando o desvio de dinheiro....devia haver um órgão mais centralizado de controle de assistência social".

2o- Parceria da prefeitura com Alelo, Sodexo, VR, habilitando cartões magnéticos, para que o morador possa se alimentar do que quiser e quando quiser. Maria Sol explica que esse é um direito garantido pela LOSAN, de acordo  com preferências alimentares, etnias e dietas de saúde. Eu também devo endossar essa proposta. Eu, Thais, vi um morador de rua que tinha diabetes morrendo aos poucos, pois nada que havia disponível para ele comer gratuitamente era compatível com sua dieta. Um músico-guitarrista me contou 2 semanas depois de sua morte: Sr. Maércio morreu.

3o- Banheiros públicos com duchas em parques, praças, Igrejas (como o estacionamento da Receita Federal que pertence à Igreja São Luís/Av. Paulista, disponibilizou no dia 25/12/16 aos moradores de rua), clubes - em parceria com a prefeitura. Essa medida serve para acabar com a segregação. Hoje, por exemplo, os espaços para banho e moradia são albergues, um tanto o quanto hostis para a autonomia humana. No chuveiro feminino da Avenida 9 de julho há ocorrência de meninas abusadas sexualmente e agredidas. Esses locais nos recordam leprosários da década de 20. A degradação de hoje é a mental e social,  com a qual tratamos nossos semelhantes que vivem na rua ainda vigora. Desta forma, nossa sociedade jamais se transformará em uma nação e nosso povo jamais se transformará em uma etnia!

Essas medidas parecem simples, mas eu endosso todas elas, pois se eu tivesse um simples chuveiro para trazer organização mental à minhas atitudes, certamente teria encontrado meu lar atual muito antes.
Vocês nem imaginam a importância de um chuveiro....A falta de banho traz imensa perturbação mental! Maria Sol conta-nos que ficou HUM MÊS sem tomar banho, por falta de local para isso e que hoje toma "banho de caneca" em um banheiro para deficientes. Nossa soberba e arrogância é tamanha à ponto de não querermos nos enxergar na dor do outro, à ponto de privá-lo de sua dignidade para reforçar nossa posição 'supostamente superior'.

A dignidade de todas as camadas da sociedade significa a dignidade do valor de nossa moeda, o real, e de nosso trabalho. E é na base mais elementar das camadas sociais que estão nossos alicerces.

Aproveito essa oportunidade para pedir, caso vocês estejam na região da Avenida Paulista, que ajudem a senhora Maria Sol M. Ela precisa ademais de moradia e voltar aos estudos, talvez na área de Serviço Social. Peço também proteção à todos nós, militantes, que temos coragem de expôr nossos pontos de vista, nossas propostas, defendendo nossas diretrizes contra a cultura da repressão.

Para finalizar, uma frase inteligente de Maria Sol, que sintetiza esse artigo: "Não queremos esmolas, mas direitos. As iniciativas precisam ter continuidade para que haja mobilidade social!"

E, ah! Maria Sol M.....um dia ainda vou te escrever uma canção bem bonita em SOL Maior!


Com humildade,


Thais Fernanda Ortiz de Moraes (Sushamana Tara Thai) SP/Brasil

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